Os métodos para realizar a ausência do ego começam com a prática de shamata, que é tranquilidade, e vipashyana, que é percepção (insight). O significado é repousar na pacificação ou repousar na tranquilidade. Normalmente temos vários pensamentos passando pelas nossas mentes, semelhante a uma grande variedade de pensamentos que nos torna distraídos e conseqüentemente agitados. A prática de shamata consiste de pacificar esta agitação e esta distração do pensamento e depois ensina a descansar ou permanecer em paz ou na tranquilidade. A razão pela qual necessitamos praticar shamata é que os pensamentos ofuscam a natureza da nossa mente, que é como dizer, que enquanto estes pensamentos não forem pacificados, será muito difícil para nós vermos verdadeiramente a natureza das nossas mentes. Pela prática de shamata pacificam-se gradualmente os pensamentos, o que torna mais fácil para ver a natureza da mente.
A base para o cultivo de shamata é o que é chamado de os três envoltórios de isolamento (threefold), que se referem ao isolamento físico, verbal e mental. Isolamento físico significa que enquanto você estiver praticando shamatha, você não estará envolvido (engajado) em nenhuma atividade física, semelhante ao trabalho ou a várias outras coisas que você pode fazer fisicamente. Isolamento verbal significa que enquanto você estiver praticando shamatha, na sessão de prática de shamata, você pára de conversar. Você pára de utilizar a sua fala totalmente. E isolamento mental significa que enquanto você estiver praticando shamata você não se entretém intencionalmente com os pensamentos, tais como os pensamentos do que você fez no passado ou pensamentos ou planos que você tem para o futuro.
Imagina-se às vezes que a postura física requerida para a prática de shamata é a dos Sete Dharmas de Vairocana. De fato é a postura ideal e pode ser usada por alguém que é capaz fisicamente de se manter confortavelmente nela. Contudo, se você tem uma lesão ou uma outra situação, tal como a uma lesão nas costas ou uma lesão no joelho que torna esta postura desaconselhável em termos médicos, você pode utilizar uma postura que seja mais confortável. A função primária dela é que ela motiva a eliminação ou a expulsão do ar que é tracionado dentro do canal central, o avadhuti. O segundo aspecto da postura é que as mãos estão colocadas abaixo do umbigo no gesto de colocação equilibrada (even placement) ou meditação. Ela motiva a tração do vento digestivo para dentro do canal central. O terceiro aspecto é que os braços estejam retos, empurrando os ombros para cima, que causa a tração do vento que penetra e que se difunde dentro do canal central. O quarto aspecto é que a coluna fique ereta o quanto for possível, isto faz com que os ventos dos quatro principais discos ou chakras - o masuchakra ou disco da grande alegria, na cabeça; o sambogachakra ou chacra do regozijo, na garganta; o dharmachakra ou chacra da emanação, no coração; e o nirmanachakra ou chacra de emanação no abdômen atrás do nariz - para serem tragados dentro do canal central. O quinto é o seu queixo ficar ligeiramente inclinado para o seu pescoço, isto faz com que o vento se movimente para cima para ser tragado dentro do canal central, o avadhuti. O sexto é aquele no qual os seus lábios permitem repousar naturalmente, como se diz, que eles não estão nem contidos com força e nem abertos, e isto ao mesmo tempo em que a sua língua toca de leve a parte o alto do palato. Isto causa a diminuição natural dos pensamentos. O sétimo é aquele que você olha naturalmente com os olhos abertos ligeiramente para baixo através de uma linha imaginária de quatro dedos de extensão em frente à ponta do seu nariz. Este tipo de contemplação faz com que a sua percepção seja naturalmente clara. Isto lhe protege dos defeitos do torpor e do sono. Estes são os sete aspectos da postura chamada "Os Sete Dharmas de Vairocana".
A respeito das técnicas mentais de shamatha, há uma grande variedade delas. Uma irei demonstrar esta tarde. Que é comumente ensinada no começo, é acompanhar a respiração A respiração, como nós sabemos, ela é uma função do vento cármico, e portanto, trabalhar com a respiração tem vários benefícios. Quando o corpo humano é gerado através da concepção e da gestação, os canais primários que surgem estão dentro do avadhuti, o canal central, estão no centro do corpo; rasana que é vermelho, está á direita de avadhuti; e lalana que é branco, está a esquerda de avadhuti. Neste momento, estes dois canais laterais circulam dentro ou ligam-se ao avadhuti abaixo do umbigo. Mas no topo eles se agarram, se cruzam, se entrelaçam para frente e terminam nas fossas nasal direita e esquerda, respectivamente. Portanto, há atributos distintos da respiração que flui tanto pela fossa nasal esquerda como pela direita. A respiração que flui através da fossa nasal direita, que é conectada como o canal rasana, é conhecida por "vento do sol venenoso", e ela é o aspecto de prajna. A respiração que flui através da fossa nasal esquerda é conhecida por "vento da lua de ambrosia", e ela é o aspecto de upaya, método ou grande felicidade.
A respiração ou os ventos que fluem através de cada um destas fossas nasais em ambos os casos compartilham dos ventos dos cinco elementos. Mas eles têm funções diferentes. Os ventos dos cinco elementos que fluem através de rasana e depois emergem e entram na via da fossa nasal direta são os ventos que geram cinco kleshas: apego, aversão, orgulho, ciúme e apatia. Os ventos que fluem através da fossa nasal direita e portanto estão conectados com lalana, são ventos que permitem o contato das faculdades dos sentidos com seus objetos. Eles são ventos que permitem, por exemplo, a apreensão visual da forma, a apreensão do som pelo ouvido e assim por diante. Por isso, quando você pratica shamatha acompanhando a respiração, conforme a sua mente se acalma em seguida, os ventos destes dois canais são levados para dentro do canal central ou avadhuti. Quando os ventos de rasana, o canal do lado direito, são levados para dentro de avadhuti, devido a eles serem os ventos que permanecem do lado de fora de avadhuti que cria os kleshas, depois quando eles são levados para dentro de avadhuti, os kleshas são reduzidos ou se acalmam naturalmente. E quando os ventos do canal do lado esquerdo, lalana, são levados para dentro de avadhuti, devido a eles serem os ventos que quando deixam o exterior de avadhuti que produz as experiências confusas dos sentidos, depois quando eles são levados para dentro de avadhuti, você sente que a consciência naturalmente se torna clara. E tornando-se clara, você desenvolve sensibilidades extraordinárias, tal como a habilidade, por exemplo, de ver coisas a uma longa distância, de ouvir coisas a uma longa distância e assim por diante.Quando você utiliza a respiração como técnica de shamatha, é importante não manipular a respiração de modo algum. Você pode não estar tentando controlar a respiração fortemente ou respirar mais fortemente do que o normal, nem mesmo você pode estar tentando para a respiração de algum modo. Você simplesmente utiliza o vem e vai natural e segue a respiração como a base para a sua meditação.
É óbvio, quando você está praticando shamatha, os pensamentos continuam ainda a aparecer. Quando você perceber que a presença deste pensamento está distraindo você em relação à respiração, então simplesmente você irá reconhecer que você se tornou distraído, deixe o pensamento ir embora e volte para a técnica, que neste caso é seguir a respiração. Agora iremos experimentar isto juntos, que como se diz, prática de shamatha utilizando a técnica de seguir a respiração, durante dez minutos.
O período de tempo pelo qual você faz esta prática, que é como se diz, a duração da sessão. Se você tem bastante tempo para praticar e se você consegue praticar por um longo período todos os dias, isto é excelente. Mas se você consegue praticar por períodos mais curtos, é também aceitável. Como é falado geralmente, nos comentários do Mahamudra: é dito que se você pode praticar em sessões curtas muitas vezes por todo o dia, estão esta é a melhor forma. Se você tem alguma pergunta sobre esta técnica, por exemplo, o que exatamente significa assentar a sua mente na respiração, e como fazer isto, como usar a sua percepção em conjunto com a sua respiração e assim por diante, agora é um bom tempo para fazer estas perguntas. E lembre-se que algumas das suas perguntas são semelhantes às feitas pelos outros, assim a sua pergunta irá ajudar os outros.
Pergunta: Tenho duas questões. A primeira é que comumente as instruções a respeito do posicionamento dos olhos: somos ensinados a olhar ligeiramente para baixo com os olhos semi cerrados para acalmar a agitação, e que para purificar o torpor, somos geralmente ensinados a olhar para cima. Rinpoche parece ensinar parcialmente, o modo contrário desta vez. Assim, o senhor poderia esclarecer isto, e depois, o Senhor poderia dizer algo mais a respeito do vento penetrante?
Tenga Rinpoche: De fato, a intenção deste olhar fixo e que ao impedir a agitação ou pacificar a agitação, a mente torna-se mais clara. É também verdade que há instruções para levantar ou abaixar o olhar, isto depende se você é mais afetado pelo torpor ou pela agitação. Basicamente, você utiliza a visão adequada ao tipo de prática específica que você está fazendo. Por exemplo, se você está fazendo prática do dzogchen, ou se você está fazendo prática da luminosidade dentro dos seis dharmas da tradição do Mahamudra, você pode utilizar sempre o olhar fixo voltado para cima direcionado para dentro do meio do espaço. Por outro lado, para a maioria das outras formas da prática de shamatha você olha voltado para baixo. A razão pela qual você abaixa o olhar fixo na prática de shamatha é que o problema primário que a prática de shamatha está remediando é a agitação.
Comumente, os seres sencientes experienciam uma exibição ininterrupta de agitação ou de pensamentos agitados, e a função primária ou inicial da prática de shamatha é pacificá-las. Portanto, o olhar fixo mais apropriado, para fazer isto, é o olhar fixo para baixo. Pode ser que você queira saber por que é que abaixando o seu olhar fixo pacifica os seus pensamentos. A razão é mais claramente explicada nos comentários dzogchen, onde é explicado que há uma conexão física entre os canais ou nervos dos olhos e o canal do coração. O canal que segue do coração até os olhos é chamado de canal de cristal kati. Devido a conexão física entre os olhos e o coração, há uma conexão íntima particular - se você considerar todos os órgãos dos sentidos - entre os olhos e o pensamento conceitual.
Portanto, seus olhos de certo modo são os portais para o pensamento conceitual, assim como para a percepção visual também. É também por isso que, na própria prática de dzogchen, quando se trabalha com a visão das quarenta e duas deidades pacíficas e das cinquenta e oito divindades iradas, estas visões podem surgir em primeiro plano. A verdadeira existência inata das deidades pacíficas e iradas dentro do nosso corpo está primeiramente dentro do chakra do nosso coração, o dharma chakra, onde elas habitam na forma da bodhicitta branca e da bochicitta vermelha. Mas devido à conexão física entre o coração e os olhos, então quando se faz práticas dzogchen, você vê aparentemente estas divindades pacíficas e iradas externamente a você, inicialmente na forma de círculos ou de discos de luz, e em seguida na forma de discos de luz menores, e então finalmente em suas formas completas. Devido a esta mesma conexão, no contexto ordinário ou na situação ordinária, os seus pensamentos estão extremamente conectados ao coração físico, e você pode portanto afetar o desenvolvimento do pensamento através da mudança do seu olhar fixo, especificamente olhando ligeiramente para baixo.
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